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MURRO EM PONTA DE FACA

Tenho um amigo que todos consideram gay. Sinto uma coisa estranha por ele. Estamos sempre conversando e indo à casa de um conhecido que é gay. Quando sei que eles estão juntos ou conversam pelo telefone, fico tocado. Quando conversam ao pé do ouvido nas baladas, fico me corroendo de raiva, de ciúme.

O meu amigo às vezes dá pinta de ser gay. Assim que eu começo a atacá-lo, ele desconversa, dizendo que sonha ter filhos, casar… Estou em dúvida. Não sei se devo atacá-lo ou não.

 

 

Todos o consideram gay você também. Só que ele não é assumidamente gay, e isso muda tudo. Explica talvez o emprego do verbo atacarcomo sinônimo de seduzir. Na medida em que o seu amigo não assumiu a homossexualidade, seduzi-lo não deixa de ser uma forma de violência. Porque a sedução o desvia do caminho em que ele quer estar. O caminho com o qual ele sonha.

O verbo atacarme remete ao romance de Chardelos de Laclos, Ligações Perigosas, que virou filme de cinema. Laclos foi um oficial do exército francês que se tornou escritor. Escreveu vários livros sobre estratégia e se tornou célebre por Ligações Perigosas, um verdadeiro tratado do mal, cujo tema é a paixão. Aí, a relação entre as pessoas – como a relação entre os exércitos – é função de uma seqüência de manobras. Depende da tática e da estratégia. Ataque, defesa etc. Porque só o desejo sexual e a vaidade estão em jogo.

Nada disso tem a ver com o amor, que vive do acordo entre os amantes e ignora a luta de prestígio. Seja como for, ainda que você morra de tesão pelo seu “amigo”, o melhor é renunciar. De que adianta fazer alguém que “desconversa” ceder ? Ou seja, transar a contragosto? O que conta na vida é o encontro. Quando este não é possível, não há porque insistir. Equivale a dar murro em ponta de faca.

 

 

O AMOR IGNORA A LUTA DE PRESTÍGIO

 

 

Publicado em Fale com ela