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BARRIL DE PÓLVORA

Sou casado há quatro anos. Amo minha mulher e não vejo razão para me separar. Eu e ela somos amigos próximos de um outro casal com o qual saímos juntos freqüentemente a bares, restaurantes, shows, teatros. Há um ano, eu e a mulher dele transamos quase toda semana. Não sentimos culpa, mas eu morro de medo de ser descoberto. Você acha que é possível manter essa relação e não ter mais medo? Vivê-la com segurança?

Você diz que ama a sua mulher, embora transe com outra. Será que você ama a sua mulher ou o vínculo de casamento que você tem com ela? E você diz que é amigo do outro casal. Como assim? Você certamente não é amigo do marido. Tampouco da esposa dele, que é sua amante. Os amigos não transam.

Sua conduta é contrária ao amor e à amizade. O que o amigo mais deseja é contentar o amigo, e o marido da sua amante ficaria particularmente descontente se descobrisse os fatos. Ou não? Por outro lado, o amigo deseja a paz e você prepara a guerra.

Você só não sente culpa porque o que conta para você é o gozo do sexo, que a relação clandestina exacerba. Viver e morrer para esse gozo é hoje o seu lema. Até aí, tudo bem, questão de livre-arbítrio. Mas você quer segurança e me pergunta se isso é possível. Como você não é um libertino francês do século XVIII, a resposta é não. Para eles, o gozo também estava acima de tudo e só a exacerbação do prazer contava. Só que o amor era quase uma palavra feia, o casamento não excluía o sexo fora dele e a organização da família era perfeitamente compatível com a inclusão do/da amante. Assim, o prédio onde hoje é o Museu Picasso, em Paris, foi construído por um conselheiro de Luís XIV para abrigar sua esposa e também o amante casado da esposa com a família dele inteira. O século XVIII na França foi um século de inclusão. Nada a ver com os tempos de hoje.

O fato é que você está sentado num barril de pólvora e vai continuar se não entender o motivo pelo qual cria situações impossíveis. Para você mesmo, para a sua esposa, para o marido e para a amante. Sartre considerava que só é livre quem quer o que pode. Você só quer o que não pode e, assim, apesar de tanta transgressão, não goza de liberdade.

 

O AMIGO DESEJA A PAZ

Publicado em Fale com ela

Comentários sobre "BARRIL DE PÓLVORA"
  1. Simplesmente perfeita a resposta para o questionamento do marido que parece estar confundindo todos os papéis. Certamente quer apresentar à sociedade que é um homem casado, mas está muito longe de viver realmemte o propósito de um casamento. Além do que, também ser “amigo” dele, foge aos princípios do que se espera de uma amizade de verdade.

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