consulta com Betty Milan

CIBERLOVER FELIZ

Sei que existe paixão pela internet, mas eu prefiro o amor verdadeiro. Há dois anos comecei a me corresponder com homens de diferentes nacionalidades. Um dia conheci um português que, em princípio, só queria a minha amizade “por estarmos muito longe um do outro”, ele na Europa e eu no Brasil. Mas as mensagens foram se tornando cada vez mais amorosas. Até que eu pedi para ouvir a voz dele e a resposta foi não. Ou melhor, “só quando nós nos virmos”. Fiquei achando que era papo-furado até ele me perguntar se eu desejava encontrá-lo no meu aniversário. Eu disse que sim e nós nos encontramos em São Paulo para viajar vinte dias juntos pelo Brasil.

Durante a viagem, embora eu tivesse acabado de conhecê-lo, tinha o sentimento de que o conhecia há muitos anos. Foram vinte dias simplesmente maravilhosos e nós agora vamos nos ver de novo. Escrevo para contar uma história boa que nasceu na internet.

 

Você prefere o amor verdadeiro à paixão e o seu ciberlover também. A prova disso é que, no começo, ele queria só amizade para que vocês não corressem o risco de sofrer. O amor dele é verdadeiro por ser delicado, é um amor amigo. Vocês se encontraram no tempo da delicadeza, o tempo que Chico Buarque exalta numa de suas canções.

Quem prefere a paixão, ao contrário de você, não teme o sofrimento, cultiva-o. A exemplo disso as cartas da religiosa portuguesa, livro clássico, escrito no século XVII. Na falta do amante, a religiosa escreve a ele: “Antes sofrer do que esquecê-lo”. Ou: “Tenho um prazer funesto em arriscar a minha vida e a minha honra”.

Para quem quer o fogo da paixão, o que mais importa é se consumir nele. “Poderia eu contentar você com uma paixão menos ardente do que a minha?”, pergunta a religiosa precipitando-se na labareda. Arder é para ela sinônimo de viver e o amante acaba sendo um mero pretexto. Acho que, se ela o encontrasse, certamente o estranharia, à diferença do que aconteceu com você, que, já durante a primeira viagem, teve o sentimento de conhecer o ciberlover há anos.

Foi assim porque o amor de vocês é amigo e os amigos se reconhecem quando se encontram… O amor dos amigos precede o encontro e dispensa maiores apresentações. Há nele algo de inexplicável, porque nasce do coração, cujas razões a razão desconhece, como diz o adágio.

 

 O AMIGO RECONHECE O AMIGO

Publicado em Fale com ela