consulta com Betty Milan

EM MATÉRIA DE SEXO, NÃO EXISTE CERTO NEM ERRADO

Eu e meu noivo estamos juntos há oito anos. Nós nos damos muito bem, temos projetos em comum, partilhamos a vida com alegria e esperança. Somos diferentes de todos os nossos amigos e parentes, porque gostamos de sair com outros casais, mulheres e homens. Ele gosta de me ver com outros e outras e nós eventualmente trocamos de parceiros quando saímos com casais. Somos muito felizes assim, nunca brigamos. Sabemos dividir nosso tempo entre a vida a dois e as nossas aventuras.

No entanto, vivo sobressaltada por causa dessa vida dupla, oprimida pela normalidade dos amigos e da família. Recentemente, li o artigo de um psicólogo para quem o nosso estilo de vida é uma forma de fugir dos compromissos ou de infantilidade. Fiquei mais angustiada ainda. Fico esperando a hora em que tudo vai dar errado. Gostaria que você me dissesse o que pensa.

 

O seu estilo de vida é o de muitos libertinos. Não há nele nada de irresponsável ou de infantil. Você e o seu noivo são responsáveis em relação ao vosso desejo, cuja realização em princípio não faria mal a ninguém. Escrevi em princípioporque você não suporta a transgressão. Se deixa culpabilizar pela normalidade alheia e depois, para não arcar com a culpa, vive à espera do fim do noivado.

Já são oito anos que você se exercita com o noivo na libertinagem. Portanto, não vai abrir mão do gozo que ela propicia e não tem por quê. Só resta descobrir a razão da culpa para superá-la. A saída, hoje, é a porta do consultório do analista.

A menos que seja a leitura dos grandes clássicos libertinos. Como A história da minha vida, de Casanova, um mestre da sedução que nunca se serviu do amor para dominar o outro. Sua sensualidade não era incompatível com uma certa moral do sentimento e ele só violava as convenções estabelecidas a contragosto. Para seduzir, improvisava, deixando-se inspirar por um grande otimismo e um gosto ilimitado da felicidade.

A libertinagem dele nada tem a ver com a do herói do romance libertino francês, que se serve do amor para realizar a sua fantasia sexual, às custas da parceira. Este herói faz da inconstância uma meta, só procura o prazer dos sentidos e a satisfação da própria vaidade. Um bom exemplo é Valmont, personagem de As ligações perigosas, de Choderlos de Laclos.

Tanto Casanova quanto Valmont inspiraram grandes cineastas. O primeiro inspirou Fellini e o segundo, Stephen Frears. Isso aconteceu porque a libertinagem é um grande tema. A sexualidade é vital e o libertino a exalta.

 

Publicado em Quem ama escuta