consulta com Betty Milan

O gosto da derrota

Há duas décadas eu me debato com a contradição paixão x casamento. Até hoje não consegui me realizar num relacionamento. Sempre que a paixão passa, o que fica é a frustração e o gosto da derrota.

Há poucos meses me casei pela segunda vez, oficializando um relacionamento já desgastado e sem paixão. Casei para dar uma vida de família ao meu filho, que ficou privado da companhia do pai quando eu me separei para viver uma paixão com o homem que hoje é o meu marido morno.

O mais grave é que, ao casar pela segunda vez, eu abri mão do relacionamento com o homem por quem estou apaixonada agora. Ele é louco por mim. Com ele, tive orgasmo pela primeira vez e eu poderia dizer: “Ele é tudo o que eu sempre quis!”.

O mais lógico seria me separar e viver o novo romance. Mas o que eu faço se daqui a alguns anos o meu relacionamento com este amante se transformar numa outra versão do meu casamento atual?

 

O que me chama a atenção é a expressão “gosto da derrota”. Ela explica por que você oficializa um relacionamento desgastado com um homem quando está apaixonada por outro. Há nisso um prazer masoquista evidente. Como a história já aconteceu duas vezes e existe a possibilidade de acontecer uma terceira, está mais do que na hora de você se tratar e parar de se repetir.

A repetição tem origem inconsciente e faz o sujeito se colocar em situações penosas, revivendo uma experiência do passado sem se lembrar dela e com a impressão de estar reagindo a um fato atual. Foi a partir de fenômenos de repetição observados na clínica que Freud introduziu na teoria psicanalítica a noção de pulsão de morte, sinônimo para ele de uma força “demoníaca”, independente do princípio do prazer e capaz de se opor a este.

Demoníaca porque age sorrateiramente e nos deixa impotentes. Não fosse a pulsão de morte, nós já teríamos sustado a guerra, que confunde as maiores inteligências e foi a principal atividade das nações nos últimos 500 anos. Só no século passado, 115 milhões de pessoas morreram por causa das guerras.

Quem está em guerra contra si mesmo precisa descobrir a razão disso para conquistar a paz. Dizem que gosto não se discute, mas é altamente discutível quando expõe a pessoa ao gosto amargo da derrota.

NEM TUDO O QUE É DE GOSTO REGALA A VIDA

 

Publicado em Fale com ela